O Doutor em Biomedicina Pablo Barrecheguren fala sobre o termo Brainbow, uma técnica que permite distinguir neurônios vizinhos.
Em 1906 o Prêmio Nobel de Medicina foi compartilhado entre Camilo Golgi e Santiago Ramón y Cajal. Em grande parte foi concedido a Golgi por criar um tipo de coloração que marcava os neurônios e suas ramificações, mas esta apresentava o problema de que, por haver tantos neurônios, era muito difícil ver onde começava e terminava cada neurônio.
Cajal alterou a coloração para que ficasse possível distinguir muito menos neurônios, o que permitiu ver individualmente cada uma das células e descobrir que na comunicação entre neurônios existem espaços de separação.
O Brainbow
Assim, desde os primórdios da histologia tem sido um problema constante distinguir os neurônios e suas prolongações dentro de uma coloração.
E não é para menos, pois nosso cérebro contém mais de 100.000 quilômetros de conexões, mas felizmente em 2007 foi publicada a primeira versão de uma técnica que permite ver individualmente cada uma dessas conexões: o Brainbow.
Os conceitos do Brainbow
Esta técnica baseia-se em dois conceitos muito simples:
- É possível gerar animais transgênicos que expressam proteínas fluorescentes de diferentes cores. Por exemplo, existe a proteína fluorescente verde (GFP, Green fluorencent protein) ou a proteína fluorescente vermelha (RFP, Red fluorencent protein).
- Se cada célula de um tecido animal tiver diferentes tipos dessas proteínas fluorescentes e em quantidades variadas, então cada célula terá uma cor diferente.
Partindo dessa base, foram gerados animais (inicialmente se trabalhou com camundongos) que tinham três ou quatro proteínas fluorescentes diferentes que se misturavam graças à ativação de um gene (uma recombinase também introduzida artificialmente no genoma), o qual mistura aleatoriamente as quantidades e os tipos de proteínas fluorescentes em cada célula.
O resultado disso é que se obtêm aproximadamente 100 combinações diferentes de cores. A chave aqui é que essa mudança de cor é permanente e marca toda a célula, incluindo suas ramificações.
Como isso ocorre nos neurônios do cérebro, isso permite um estudo detalhado do que se conhece como o conectoma, (o conjunto de conexões entre neurônios) e já facilita analisar ao microscópio onde cada neurônio se conecta.
Embora, isso sim, exija um importante trabalho de bioinformática e microscopia eletrônica para lidar com um volume tão grande de conexões.
Mas o estudo do conectoma vale a pena, pois são as conexões que permitem a passagem de informação entre corpos neuronais e que realmente explicam como o cérebro funciona cada vez que executa uma tarefa.
O Brainbow em outros organismos
A importância do Brainbow é tanta que ele foi importado para outros organismos onde é possível a manipulação genética.
Um exemplo é Drosophila melanogaster, a mosca-da-fruta, onde existe uma intensa pesquisa em neurociência tanto em nível básico estudando o desenvolvimento cerebral, como em nível biomédico, com trabalhos que usam a Drosophila para investigações sobre Parkinson ou Alzheimer.
E outro exemplo é o Dario rerio ou peixe-zebra, que, graças ao fato de ser transparente durante as primeiras fases de seu desenvolvimento, é usado para o estudo da formação inicial do sistema nervoso dos vertebrados.
Além disso, não podemos esquecer que, embora originalmente o Brainbow fosse uma técnica desenvolvida para estudos neurocientíficos, é possível adaptar essa ferramenta em outros tipos de tecidos.
O Brainbow e a biologia celular
Com tudo isso, o Brainbow tornou-se uma das ferramentas mais populares da biologia celular. Ainda se mantém como uma ferramenta importante no estudo do conectoma, que é, sem dúvida, o grande desafio neurocientífico do século XXI.
Mas também pode ser usado em outras tarefas como, por exemplo, o estudo de linhagens celulares: uma vez ativada a técnica, a mudança de cor nos neurônios é permanente e, além disso, é hereditária.
Ou seja, se essa célula se divide, suas células filhas manterão a cor de sua célula progenitora. Isso permite estudar com precisão quais células dão origem a quais tecidos, ajudando assim a compreender com maior profundidade o campo das células-tronco neuronais.
E é que o Brainbow não é somente uma das técnicas mais vistosas que a biologia molecular possui, mas também uma das mais versáteis.
Saiba mais sobre
NeuronUP
Experimente Gratuitamente
A plataforma que mais de 4.500 profissionais utilizam todos os dias
Bibliografia
- Benjamin Richier and Iris Salecker. Versatile genetic paintbrushes: Brainbow technologies. WIREs Developmental Biology (2015). Volume 4.
- Dawen Cai, Kimberly B. Cohen, Tuanlian Luo, Jeff W. Lichtman, and Joshua R. Sanes. New tools for the brainbow toolbox. Nat Methods (2013). 10(6): 540–547.
- Jean Livet, Tamily A. Weissman, Hyuno Kang, Ryan W. Draft, Ju Lu, Robyn A. Bennis, Joshua R. Sanes & Jeff W. Lichtman. Transgenic strategies for combinatorial expression of fluorescent proteins in thenervous system. Nature (2007). Vol 450.
- Michel A. Hofman. Evolution of the human brain: when bigger is better. Frontiers in Neuroanatomy (2014). Volume 8, Article 15.
- Zoe T. Cook, Nicole L. Brockway, Zachary J. C. Tobias, Joy Pajarla, Isaac S. Boardman, Helen Ippolito, Sylvia Nkombo Nkoula, and Tamily A. Weissman. Combining near-infrared fluorescence with Brainbow to visualize expression of specific genes within a multicolor context. Molecular Biology of the Cell (2019). Volume 30







Cérebro na gravidez: mudanças neurocognitivas e neuroplasticidade materna além do “cérebro de mamãe”
Deixe um comentário