A doutora em Psicologia Clínica da Saúde María J. García-Rubio, junto com a especialista em neuropsicologia clínica e em transtorno cognitivo maior Nancy Navarro, explicam neste artigo o que é a exploração neurológica, bem como suas técnicas e aplicabilidade clínica.
Introdução
O conhecimento da estrutura e função do sistema nervoso (SN) requer que se conjuguem certas disciplinas como a fisiologia, a medicina, a psicologia e a biologia, entre outras. Por isso, muitas delas compõem a neurociência e os marcos que a acompanham como um ramo específico do estudo do SN em suas versões saudável e patológica.
Para realizar os estudos científicos que coletam informações sobre o desenvolvimento do SN, suas partes e modo de funcionamento, é necessária uma metodologia comum a essas disciplinas que se unem em torno da exploração neurológica. E é daí que surgem as técnicas de exploração neurológica.
O que é a exploração neurológica?
A exploração neurológica é a ação através da qual se podem extrair conclusões precisas sobre a estrutura e a função de diversos aspectos do sistema nervoso (González e López, 2013), sendo um fator chave o tipo de técnica de exploração neurológica e o mecanismo subjacente a ela.
Técnicas de exploração neurológica
O desenvolvimento das técnicas de exploração neurológica remonta à evolução do conceito de cérebro, que coincide com o período de algumas das bem conhecidas teorias filosóficas como a de Hipócrates (c. 460-370 a.C.), que descreveu o cérebro como sede da experiência e da inteligência.
Andrés Vesalio (1514-1564) foi o primeiro a descrever a anatomia do cérebro por meio de ilustrações reunidas em sua obra “De humani corporis”; e também René Descartes (1596-1650) descreve o cérebro como uma máquina complexa, semelhante ao coração, que controla as ações complexas do ser humano.

A pneumoencefalografia
Em 1919, Walter Dandy (1886-1946) desenvolveu a pneumoencefalografia, um método que consistia em realizar uma radiografia do cérebro por meio da substituição do líquido cerebral por ar, oxigênio ou hélio.
O eletroencefalograma
Após essa primeira técnica de exploração neurológica, surgiu o eletroencefalograma pelas mãos do alemão Hans Berger (1873-1941) como um método capaz de revolucionar a exploração neurológica conhecida até então. Pois, com o EEG o pesquisador não obtém uma radiografia do cérebro, mas pode conhecer os tempos e as áreas cerebrais em que ocorre a atividade cerebral baseada em potenciais pós-sinápticos registrados no couro cabeludo da pessoa.
Outras técnicas de exploração neurológica e suas variantes
Posteriormente, outras técnicas de exploração neurológica foram a angiografia proveniente da lobotomia de XX. Entretanto, foi no final dos anos 60 quando surgiram as técnicas funcionais de exploração neurológica, como a magnetoencefalografia (MEG) por Cohen (1968), a tomografia computadorizada (TC) e a ressonância magnética (RM), juntamente com o desenvolvimento da tomografia por emissão de pósitrons (PET) (Posner e Raichle, 1994).
Finalmente, nos anos 80 e seguintes, foram criadas novas variantes dessas mesmas técnicas de exploração neurológica com as quais os pesquisadores são capazes de extrair dados cerebrais cada vez mais precisos e interessantes.
São exemplos disso a técnica de estimulação magnética transcraniana (EMT), a tomografia por ressonância magnética funcional (RMf) e suas diversas aplicações, entre as quais se destacam os sinais BOLD, T1 e T2. Além disso, desde 1994, tem-se acesso à exploração neurológica a partir de dados de imagem que provêm de técnicas mais atuais, como o tensor de difusão, que permite visualizar o trajeto das fibras nervosas, entre outras (Fuller, 2020).
Métodos de exploração neurológica
Ao longo desta postagem, faremos um breve resumo sobre os métodos de exploração neurológica que existem e nos concentraremos especialmente nos métodos funcionais, que são os mais utilizados atualmente devido à sua grande contribuição nos estudos de neurociência cognitiva com seres humanos.
Métodos lesionais
Os métodos lesionais são técnicas de exploração neurológica que utilizam lesões cerebrais como hipótese para conhecer o desempenho do cérebro relacionado a um comportamento, ou seja, analisam estruturas cerebrais danificadas e sua influência no comportamento.
Sua metodologia é ampla para o estudo de diferentes cenários, tanto para lesões provocadas espontaneamente devido a um dano cerebral adquirido, quanto para lesões resultantes de um processo cirúrgico (Humphreys et al., 2021).
Entre esses métodos destacam-se o análise macroscópico e microscópico, cujo propósito é fornecer informações sobre a composição morfológica e arquitetônica do tecido nervoso pós-mortem. O anterior é realizado por meio de procedimentos como fixação, coloração ou seccionamento, para conhecer a natureza química e molecular em nível macro ou microscópico.
Métodos instrumentais
Esses métodos permitem a exploração neurológica por meio do registro e observação do desempenho cerebral em diferentes tarefas, através de instrumentos com adequação específica para controlar as variáveis que afetam de forma indireta o funcionamento do cérebro (Marinescu et al., 2018).
Algumas técnicas de exploração neurológica que se enquadram nessa categoria são as sensoriais, provenientes do paradigma de divisão sensorial, segundo o qual diferentes informações de entrada são manipuladas de forma que vários estímulos controlados chegam a ambos hemisférios cerebrais ao mesmo tempo e competem pela chegada. Entre elas destacam-se a audição dicótica, campos visuais separados e palpação diáptica (Maes et al., 2017; Vendetti et al., 2015).
Também são métodos instrumentais de exploração neurológica as técnicas motoras, como a interferência motora, que exige que o participante realize duas tarefas motoras simultaneamente, por exemplo, com o teste de batida.
Métodos funcionais
Os métodos funcionais são aqueles que registram alterações nas atividades cerebrais, mediante a manipulação de variáveis comportamentais. Dentro dessa categoria, destacam-se as técnicas de exploração neurológica eletromagnéticas e metabólicas.
Técnicas eletromagnéticas: entre elas destacam-se a eletroencefalografia, potenciais evocados e a magnetoencefalografia.
— Eletroencefalograma
É uma técnica não invasiva que permite estudar o sistema nervoso central. A partir dela, obtém-se a exploração cerebral enquanto são realizadas diferentes tarefas diante de estímulos distintos.
O método permite amplificar a atividade bioelétrica cerebral, ao detectar a atividade de campos elétricos gerados por potenciais pós-sinápticos das células piramidais do córtex. Os padrões de ondas gama, beta, teta e delta gerados durante o processo se associam ao comportamento e à consciência, sendo estes mensurados por sua frequência e amplitude.
As principais condições clínicas que podem ser detectadas por meio dessa técnica são: diagnóstico de transtornos epilépticos, classificação de patologias do sono, alterações no nível de consciência (Keren et al., 2018).
— Potenciais evocados (PE)
Mede alterações na atividade elétrica cerebral por meio de um estímulo sensorial externo. A atividade é detectada por eletrodos posicionados no couro cabeludo, fornecendo informações como indicador da atividade neural (Bestmann e Krakauer, 2015).
Esses potenciais são utilizados para a avaliação da via auditiva e estudos em: recém-nascidos com probabilidade de hipoacusia, doenças degenerativas e desmielinizantes (Norcia et al., 2015).
— Magnetoencefalografia
Consiste em um exame que mede os campos magnéticos gerados pelas correntes elétricas do cérebro e detecta alterações em áreas específicas. O procedimento consiste em um ou mais ícones que se deslocam pela superfície do crânio e produzem um mapa de isocontornos que representam diferentes intensidades do campo magnético.
Na prática clínica, essa técnica de exploração neurológica é utilizada para localizar o foco de crises epilépticas (Förster et al., 2020).
Técnicas metabólicas: aqueles instrumentos de exploração neurológica que permitem detectar o nível de atividade metabólica cerebral. Para isso, utilizam-se as seguintes técnicas: tomografia por emissão de pósitrons, tomografia computadorizada por emissão de fóton único e a ressonância magnética funcional.
— Tomografia por emissão de pósitrons (PET)
É empregada para explorar a atividade metabólica neuronal a partir de radiomarcadores que permitem medir o fluxo sanguíneo, mecanismos transportadores de dopamina ou a recaptatação de serotonina.
Esse processo não apresenta riscos ao paciente; ao contrário, as moléculas radioativas emitem partículas chamadas pósitrons para determinar a região cerebral que se deseja explorar e criar uma imagem em cores do encéfalo (O’Neill et al., 2015). Esse método é amplamente utilizado na detecção de doenças neurodegenerativas.
— Tomografia computadorizada por emissão de fóton único (SPECT)
É uma técnica utilizada no campo da medicina nuclear. Combina imagens bidimensionais que, ao serem combinadas, formam uma única imagem tridimensional.
Essa técnica de exploração neurológica é bastante utilizada na avaliação da doença cerebrovascular e em pacientes com suspeita de síndrome demência e/ou lesão cerebral traumática (Pelegrí Martínez et al., 2017).
— Ressonância Magnética Funcional (RMf)
Permite medir o metabolismo regional ao detectar oxigênio nos vasos sanguíneos do encéfalo. A explicação fisiológica mostra que, à medida que as neurônios estão mais ativas, utilizam maior quantidade de oxigênio, o que produz uma redução desse em sangue (Keren et al., 2018).
As neurônias enviam sinais aos vasos sanguíneos para gerar vasodilatação e assim transportar oxigênio. A RMf compatibiliza esse trajeto com grande precisão na localização das estruturas do encéfalo.
O uso dessas técnicas de exploração neurológica é diversificado; atualmente, são empregadas no âmbito da Neurociência Cognitiva e Afetiva com população saudável ou com diagnóstico neuropatológico (Atenas et al., 2018).
Conclusão
Nesta postagem de blog, foi introduzido o desenvolvimento e o estado das técnicas de exploração neurológica, dando ênfase especial nas técnicas funcionais a partir das quais são extraídos dados de imagem, especialmente relacionados à função cognitiva do ser humano em estado de repouso e/ou enquanto realiza uma tarefa com alta ou baixa demanda, por exemplo.
Além disso, essas técnicas permitem a exploração neurológica do cérebro saudável e também do patológico.
Em conclusão, as técnicas de exploração neurológica compõem um dos métodos mais atuais, inovadores e em desenvolvimento da neurociência no âmbito nacional e internacional, pela aplicabilidade que sustentam como procedimento e pela qualidade e adequação de seus resultados.
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Bibliografia
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